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Dança consolida seu espaço no ABC

 

       Um Jornal semanal chamado News Seller tinha  acabado de se transformar no Diário do Grande ABC quando lá  cheguei para trabalhar como subchefe de  redação e também repórter, em 1969. O Brasil era muito diferente e a região  do ABC também. Lula ainda era um anônimo operário, que adorava frequentar bailes aos  domingos. A região, essencialmente industrial, não tinha sombra do vasto comércio de hoje, nem da estrutura urbana e sistema viário. E o jornal com gráfica própria, com enorme linotipos que viraram peças e museu, espremia a redação inteira, de umas 15 pessoas, numa casinha alugada onde mal cabiam as mesas, com velhas máquinas de escrever. Hoje essa mesma redação, totalmente informatizada, tem  mais de cem pessoas e  ocupa dois andares em  edifício próprio.

       Nunca mais perdi o contato com o ABC, voltei a trabalhar na imprensa da Capital e no Rio Grande do Sul. Isso motivou minha  volta para a região em mais de três períodos diferentes, primeiro na sucursal do Estadão/ Jornal da Tarde, depois no próprio Diário do Grande ABC. No emaranhado de lembranças, busco com pinça e lupa um detalhe: O mais badalado lugar da noite era um clube chamado panelinha. Eram raros os lugares para se dançar. Academias de  dança? Esqueçam, não existiam.

        O conhecimento que tenho da  região , que  não é  recente, conforme o que acabei de contar, me  deixa seguro para  afirmar que ao longo do tempo, 34 anos depois, o ABC se abriu de  forma impressionante para  a dança. Pode ser apontado como um dos lugares do Brasil que mais concentra academias, das mais  variadas modalidades, a  maioria de reconhecida qualidade. Tem também concorridos bailes semanais, com música ao vivo, em variados salões, restaurantes e choperias, que atraem não só moradores, como também pessoas da  capital e  até da Baixada Santista. Em termos de porte e estrutura, raros complexos de dança, no Brasil e  no exterior, encontram paralelo com casas como  Ilha de Capri e Estância Alto da Serra, ambas em São Bernardo, no eixo da  Via Anchieta.  Têm múltiplos ambientes e comportam  shows para  até 10 mil pessoas, oque, sob qualquer aspecto, negativo ou positivo, causam impacto.

        Na  av. Maria Servidei Demarchi, popularmente conhecida como rota dos restaurantes, ali junto da fábrica da Volksvagem, bons e  baratos restaurantes ( Pára Pedro, Florestal e São Francisco ), oferecem dança de quinta a  sábado, com bandas próprias e também mantendo oportunidade de trabalho para profissionais da dança de salão, como Neto, que há 13 anos anima com seu grupo do Instituto de Dança e Beleza  Ritmo Quente as noites do Florestal e, a partir  deste  mês ( Fevereiro 2003) também no São Francisco.

         Na  área de bailes, o expoente é o Icarai , do empresário Guerra , famoso na região desde os tempos da empresa de ônibus. Ao mudar de ramo, a ampla garagem e oficina foi totalmente reformada e se transformou num dos melhores  bailes da Grande São Paulo, sempre com música ao vivo de qualidade. O baile herdou o nome da  empresa e Guerra curte a vida, sendo um dos  raros promotores que costuma dançar muito  no próprio baile. Mas merecem ser lembrados também os bailes semanais do Corinthians Santo André e do Acasc, este último em São Caetano, com ambientes populares e saudáveis. Ocasionalmente, há também os bailes dos grandes clubes, como Aramaçã e Primeiro de Maio, em Santo André e do Clube da Mercedes-Benz, em  Diadema, reduto do simpático professor Edson, que dá aulas de dança de salão também na Universidade Fefisa.

            Por tudo isso, a distribuição do jornal Dance no ABC tem que ser feita em dois dias, para que o jornal chegue em mais de 20 lugares, entre academias e pontos de dança. Com 10 mil exemplares, na Capital o tempo médio é de uma  semana.

           Berço do novo sindicalismo, depois da derrocada em 1964 do CGT ( Comendo Gera dos Trabalhadores ), que deixou os operários órfãos de lideranças durante 14 anos, o ABC industrial e poluído, agregando todos os problemas  sociais e urbanos que se possa imaginar , poderia ser e ter tudo , menos uma vocação cultural e  artística. Quem apostasse nessa contradição há mais de 40 anos não seria levado a  sério. Engano: foi justamente esse misto de energia e caos que gerou inconformismo, inquietação, vontade transformadora - tudo aquilo que caminha ao lado, ou move  a  arte. A incrível Cia. de  dança de Diadema, expoente da inserção da dança na responsabilidade social, é o mais evidente  exemplo disso. Com a  liderança da bailarina  e  coreógrafa Ivonice Satie, foi na periferia e  tirou donas de casa da frente do fogão e do jugo machista de maridos ignorantes. Transformou mulheres simples, antes desinteressadas pelo próprio corpo, em elegantes bailarinas, aplaudidas em turnês  pelo exterior. Não pode deixar de ser lembrado também seu maravilhoso trabalho com portadores de deficiência física e mentais. Suas apresentações, superando barreiras e preconceitos, são sempre emocionantes. 

            Na Fundação das Artes , São Caetano do Sul, instituição diversificadas, existem 250 estudantes de balé clássico e moderno, estágio supervisionado para formação de professores, Grupo de Dança Juvenal , premiado no Festival  de Joinville , mais a Stacatto Cia de Dança, com bailarinas profissionais. Chega? Ainda não.

            Escolas e grupos de balé da região frequentam os mais variados festivais nacionais,  entre eles o de Joinville , em Santa Catarina . Os palcos de teatros e  ginásios locais volta e meia são ocupados por espetáculos de dança , dos  mais variados portes e padrões. Na  área social, como já se comentou neste  espaço, profissionais como as professoras Sandra e Sara Fernandes dedicam preciosas horas de suas vidas ao trabalho com menores carentes da periferia, levando-os a descobrir na dança lições de vida gregária e  até mesmo fuga de drogas.

           As academias de dança de salão estão presentes nos mais variados bairros. De repente alguma fecha suas portas, pelas dificuldades normais de qualquer negócio, mas logo surge uma nova. A maior parte está aglutinada a Associação das Escolas e Profissionais de Dança de salão do ABCD, um exemplo de  união de esforços e de interesses comuns que deveria ser seguido pelas escolas da Capital. A entidade opera de maneira bem informal, mantendo reuniões periódicas e um clima de cooperação que conta com nossa incondicional simpatia . Juntos , sem rivalidades tolas, coisa típica de gente medíocre e insegura, promovem a dança de salão e todos ganham com isso, com seus  custos em promoção e propaganda muito bem otimizados. Além da página neste jornal, produzem folhetos e recentemente instalaram um  outdoor na mais  movimentada do BC. Fazem também encontros dançantes semanais, tanto intinerantes como  habituais, às quartas-feiras na Choperia Saramandaia de ambiente simples e descontraído, a  preços baratinhos e com a  estimulante música ao vivo da Banda Manga Samba Show. Além disso, a  Associação vem promovendo uma série de workshops, seguidos de bailes, revezando oportunidades para todos os professores. Assim , todos ganham, todos se divertem e faturam, e  abre novos canais para o  crescimento da dança de salão, ou dança social, como preferem alguns.

            Este rápido balanço, com omissões  involuntárias  - porque seguramente a dança no Grande ABC tem muito do que isso - ainda  que incompleto dá a  noção do quanto se avançou nos últimos anos. Suficiente para se olhar o  presente , e o futuro, com a  recomendável prudência de sempre, mas  também com otimismo.

Nota do Editor: Todas as academias do ABC foram convidadas a participar desta  edição, inclusive da foto da capa. Ausências que possam ser notadas devem-se somente à omissão delas próprias

            Matéria própria do jornal dance. Edição89 de fevereiro de 2003

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