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LER DANÇA
Obter bibliografia sobre dança
é um problema endêmico. As vezes parece que a situação
mudará em breve, que haverá mais títulos a disposição
a curto prazo, mas não, a dança continua sendo a estante
mais escondida e mais pobre das poucas livrarias que tem a coragem de brindar-lhe
um espaço, da tradicional Barns and Nobles a moderna Virgin.
E assim, com escassas publicações
distribuídas pobremente a conseqüência inevitável
é que pouco se lê sobre dança, inclusive os próprios
estudantes e fazedores de dança. Uma realidade difícil de
ser revertida e que a Internet apenas suavizou.
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Se
lê no México
“Cuerpos en Fuga” é o estupendo
título do livro lançado pelo jornalista, crítico e
escritor mexicano Sergio A. Burquez. Trata-se de uma cobertura completa
dos 8 primeiros anos do “Encuentro Binacional de Danza Contemporánea”,
evento que acontece anualmente na cidade de Mexicali (fronteira com U.S.A.)
Burquez juntou neste volume uma coletânea
de textos críticos que à luz do tempo se revelam inteligentes,
sensíveis e bem situados. O acompanhamento cronológico do
material publicado nos desenha também o itinerário estético
de um crítico de arte que com prudência, mas com posturas
sólidas, se aproxima da dança contemporânea com olhos
curiosos e experientes.
Burquez, que já exerceu a crítica
teatral e cinematográfica, vê na dança responsabilidades
cênicas específicas; que busca, analisa e cobra. Cumpre seu
papel com responsabilidade e tino.
O fato de acompanhar o Encontro por
tantos anos lhe deu também o direito da comparação,
que exerce com presteza objetivando planos evolutivos, visualizando metas;
observando reincidências. Burquez localiza com clareza no tempo e
no espaço linhas de trabalho determinadas e dialoga com as propostas
que delas emanam.
No caso da companhia norte-americana
“Isaacs/ Mc Caleb & Dancers”, por exemplo, ele analisa a linguagem
das duas coreógrafas com sua companhia de direção
conjunta, e depois de dissolvida a companhia, os novos resultados tanto
de “Mc Caleb Dance” como do “San Diego Dance Theatre” dirigido por Jean
Isaacs.
O mesmo acontece com a companhia mexicana
“Antares”, que o autor observa antes e depois da gestão da coreógrafa
Adriana Castaños na direção.
Também aposta no novo sem reparos,
como nas ousadas propostas de Raul Parrao com seu grupo “UX Onodanza” que
qualifica como “bizarras, valentes, generosas e esplêndidas”. Sergio
A. Burquez não teme os adjetivos e os utiliza para pontuar seu discurso.
E não tem dúvidas ao questionar
a validez das propostas de “Sinalodanza”, de “Lindero Norte” ou de “Mojalet
Dance Collective”, grupo norte-americano que Burquez qualifica de “...elementar,
inacabado, superficial...”.
O autor sabe ainda exaltar o trabalho
dos intérpretes. Quanto a Maureen Fleming se referiu assim: “Quem
é esta mulher que ao mesmo tempo pode ser feto, mariposa,
ave, espíritu... qualquer idéia ou pensamento”. E citar (quando
é preciso) os grandes, como o faz em sua crítica de “Montreal
Danse” que inicia com a frase de Kazuo Ohno “- Na abundância da natureza
vejo as fundações da dança, será por um acaso
que minha alma quer tocar fisicamente a verdade?
Muitas outras companhias são
analisadas neste volume, como Betzi Roe, Pilar Medina, Stephanie Gilliland,
Danzalkimia, Contempodanza, Quiatora Monorriel, Delfos, Bill Evans Dance
Co., Utopía, Lower Left Dance e tantas outras e para cada uma delas
o autor tem um conceito para aplicar.
Enfim, “Cuerpos en Fuga” é um
documento lúcido que merece ser lido, pelo seu mérito (por
certo inusitado) de registrar oito anos de um evento e por sua característica
central que é a riqueza e o encanto de seu texto.
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Se lê nos EUA
“Fifty Contemporary Choreographers”
é uma iniciativa editorial que chega no momento certo. Em um período
onde abundam tentativas de passar a limpo o século, obras sérias
e conscientes são sempre bem-vindas.
A editora e escritora Martha Bremser,
que já foi premiadíssima por seu “International Dictionary
of Ballet” em 93, trabalhou neste projeto com 31 críticos e investigadores
de dança de grosso calibre conseguindo um compêndio lúcido
dos criadores “top” da dança. Um projeto tão audaz quanto
indispensável.
A introdução firmada pela
prestigiosa crítica de dança do “Village Voice” de Manhattan
e professora da Universidade de Nova Iorque, Deborah Jowitt, traça
com extraordinária capacidade de síntese as coordenadas básicas
da modernidade, recorrendo a personagens, episódios, obras e datas
que serão úteis ao leitor para compreender melhor a gênesis
da curadoria dos cinqüenta nomes que constam no volume.
Logicamente não faltam os grandes
nomes, as unanimidades planetárias como Pina Bausch, Trisha Brown,
Christopher Bruce, Merce Cunninghan, Mats Ek, Willian Forsythe, Jiri Kylián,
Mark Morris, Kazuo Ohno, Pilobolus, Paul Taylor e Twyla Tharp.
Mas o mais interessante está
nos criadores escolhidos da geração seguinte, o que nos deixa
como residual um possível croqui de itinerários estéticos.
É o caso dos franceses Karole Armitage, Jean-Claude Gallota e Maguy
Marin; os ingleses Mathew Bourne, Jonathan Burrows, Michael Clark, Robert
Cohan e Lloyd Newson; a belga Anne Teresa de Keersmaeker e os americanos
Carolyn Carlson, Lucinda Childs, Douglas Dunn, Eliot Feld, Bill T. Jones,
Murray Louis, Susan Marshall, Bebe Miller, Meredith Monk, Steve Paxton,
Stephen Petronio e Elizabeth Streb.
Outros nomes menos conhecidos do público
sul-americano chamarão a atenção, como as inglesas
Lea Anderson, Laurie Booth, Rosemary Butcher e Siobhan Davies, os japoneses
Eiko and Koma e Kei Takei, os australianos Ian Spink e Graeme Murphy; e
o jamaicano Garth Fagan.
É impossível não
registrar uma ausência imperdoável: o holandês Hans
Van Manen. E também considerar a falta de meia dúzia de franceses
que poderiam perfeitamente substituir a meia dúzia de anglo-saxões
agraciados nesta seleção.
Mas este passa a ser um detalhe que
em nada diminui a validade desta obra se consideramos o riquíssimo
material que está sendo exposto: Comentários sobre a obra
de cada criador e biografia resumida de cada um deles.
“Fifty Contemporary Choreographers”
é um luxo de edição que além de nos expor cinqüenta
propostas coreográficas contemporâneas, nos aproxima de textos
de críticos e investigadores hiper-competentes ajudando-nos a conhecer
e entender a dança por eles analisada.
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Se lê na França
Com o genérico título
de “La Danse au XXe Siécle”, as críticas e investigadoras
Marcelle Michel e Isabelle Ginot, conseguiram obter algo incomum: uma “obra
prima”.
Sem afã enciclopédico
mas com critérios bem estruturados as autoras conseguem passar o
século XX a limpo com “todo o material necessário” e “apenas
com o material necessário”; binômio conceitual de difícil
conjugação.
Para melhor situar o leitor, a obra
começa com um capítulo sobre origens do Ballet ocidental:
o ballet da corte, o barroco, o clássico, o ballet de ação
de Noverre, o ballet romântico e finalmente Petipa e o triunfo do
academicismo.
Com o mapa bem traçado as autoras
começam o século com o subtítulo “A sedução
da novidade” abarcando de Diaghilev e os Ballets Russes até Lifar.
Em seguida entram nas veias do neoclassicismo e os rumos da dança
moderna detendo-se na Alemanha dos anos 20 e no processo secular da coreografia
norte-americana.
Michel e Ginot focalizam Cunninghann
como uma báscula da história e submergem na ruptura do “postmodern”
com visões amplas e inteligentes sobre a dança americana,
os aportes do Japão e Alemanha da pós-guerra e lógico
a “nouvelle danse” francesa, que é descrita e analisada com magistral
idoneidade.
De sobremesa vem um “postface” de Hubert
Godard, (responsável do departamento de dança da Universidade
de Paris VIII) intitulado “O gesto e sua percepção” que tem
refinadas reflexões sobre o “pré movimento” como linguagem
não consciente da postura, a relação fundo/figura
e a percepção como fenômeno complexo.
Tudo isto em forma de livro de arte,
ou seja em um bom papel e com numerosas ilustrações, cuja
curadoria merece menção a parte, e uma feliz concepção
gráfica de Jean Castel.
Por isso “La Danse au XXe Siécle”
que integra a coleção “Librairie de la Danse” da editora
Bordas, é mais outro título que se torna indispensável
na biblioteca de todo interessado na dança.
Valerio Cesio
é crítico e coreógrafo