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CONGRESSO INTERNACIONAL
DE
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BALLET CLÁSSICO
E CONTEMPORANEO
Presidido por Natalia Makarova, o Primeiro
Congresso Internacional de Ballet Clássico e Contemporâneo
"México 2000" que aconteceu em Monterrey de 8 a 15 de julho,
foi sem dúvida o evento dancistico mais marcante dos últimos
tempos. Em primeiro lugar pela quantidade e variedade de atividades propostas
e em segundo pela diversidade e importância profissional de seus
participantes.
O fato de haver focalizado somente o
ballet permitiu às atividades teóricas mais especificidade
e maior profundidade nas suas abordagens.
A estrutura do Congresso permitiu um
aproveitamento exaustivo; pela manhã duas escolas faziam uma
breve conferência que enunciava os princípios pedagógicos
de sua tendência e a seguir davam uma classe aberta e respondiam
perguntas técnicas.
À tarde duas mesas redondas simultâneas
trataram temas pontuais como: "Promoção, Difusão e
Financiamento do Ballet", " Visão Contemporânea do Ballet",
"Concursos e Festivais", "Companhias Oficiais", etc... e paralelamente
funcionaram numerosos seminários sobre nutrição, fisioterapia,
quiropratica e reconversão laboral do bailarino entre outros temas;
e também houve uma grande variedade de cursos de ballet e repertório
para os jovens bailarinos participantes.
À noite, no Teatro de la Ciudad
houve mostras de repertório trabalhado pelas distintas escolas onde
se pode observar a fase final do trabalho de cada instituição.
Um formato rico e diverso que permitiu
aos quase mil participantes ter uma noção bastante precisa
dos objetivos tecnico-artísticos de cada escola e seu rendimento
cênico.
Os protagonistas
Um cast de alto nível guiou os trabalhos
nas diferentes áreas. As aulas abertas foram comandadas por: Lin
Chunhua da Beijing Dance Academy (China), Robert Weiss do Carolina Ballet
(USA) (tec. Balanchine), Mabel Silvera do ISA Teatro Colon (Argentina),
Fernando Alonso (Cuba), Rosario Murillo da Escuela Superior de Música
y Danza de Monterrey (México), Frank Andersen do Royal Danish Ballet
School (Dinamarca) (tec. Bournonville), Sergin Stefonseni da National Ballet
School (Canada), Donald Mahler (USA) (tec. Ceccheti), Clara Cravey do Houston
Ballet Academy, Petr Korogodski do Moscow State Academy of Choreography
(Rússia) e David Howard (Inglaterra).
Uma aula de conceitos
David Howard introduziu sua aula com
uma breve conferência onde descreveu em breves e precisas pinceladas
sua gênesis pedagógica que advém da Escola Inglesa
e desemboca em sua carreira em USA.
Sua aula se impõe pela simplicidade
não linear e pela abundância de conceitos próprios,
genuínos, vividos e pensados por este maestro inglês que desintegra
mitos e aprofunda sua ótica na idéia do corpo como unidade
individual, fonte de requisitos e radiografia única de um processo.
Trata-se de um mestre observador, sagaz
e conciso, que manipula a técnica acadêmica com rigor e liberdade;
binômio difícil de conviver e que Howard conjuga com serena
eficácia.
David Howard é mais que um mestre
treinador, é um mestre formador e descobridor de corpos que encontra
mecanismos simples para deflagrar processos complexos.
As relações que o professor
inglês estabelece entre o bailarino, seu corpo e a música
são referencias fundamentais para decodificar suas fórmulas
que funcionam como as receitas dos grandes chefs, onde são importantes
os elementos que a integram, as proporções e essencial a
sensibilidade de quem executa a mescla: o bailarino - proprietário
por direito da hipérbole que Howard pré-pronuncia.
Sem dúvida, um mestre estrela.
Fórum de debates
As mesas redondas foram as artérias
conceituais do Congresso, uma boa variedade de temas e dezenas de palestrantes
de diversas nacionalidades moldaram os trabalhos.
“O Ballet e seu impacto sócio-cultural”
foi orientado mais para a problemática latino-americana, “O ensino
do Ballet com fins não profissionais” atraiu um grande público,
“Financiamento e promoção do Ballet” revelou problemáticas
similares em diferentes regiões do globo; as discussões sobre
“Companhias Profissionais” evidenciaram diferenças orçamentárias
impressionantes e revelaram distintas estratégias de sobrevivência.
A mesa de “Festivais de Dança”
foi uma das mais objetivas e contou com três presenças marcantes:
Ciril Lafaurie, diretor do Festival e Concurso Internacional de Paris,
Sharon Wagner da coordenação do Prix de Laussane em NY e
Ilona Copen, diretora do Concurso Internacional de NY, profundos conhecedores
de seu métier fizeram aportes substanciais ao Congresso, tanto em
nível profissional como humano.
As apresentações
No palco nem todas as intenções
tiveram bom eco. Apesar de cada escola ter trazido certamente alguns de
seus alunos mais representativos, nem sempre os resultados se mostraram
coerentes aos princípios e valores enunciados nas conferências
e aulas magistrais.
Dos Estados Unidos não veio nada
de repertório tradicional e sim, revisões de clássicos.
Donald Mahler trouxe uma agradável “Cinderela”, o relato coreográfico
melhor logrado de toda a mostra e um duo menos inspirado sobre música
de Liszt, ambas interpretadas por Terence Duncan e Christina Paolucci,
o Houston Ballet Academy trouxe duas variações da questionável
“Raymonda” de Ben Stevenson interpretadas com pouca musicalidade por Rebecca
Pueringer. O Carolina Ballet trouxe duas das piores coreografias do Congresso,
“Torso de Adele” da envelhecida obra “Rodin mis en vie” de
Margo Sappington e uma versão de “Carmen” de Robert Weiss de um
mal gosto antológico.
A National Ballet School do Canadá
teve presença positiva com o pas de deux de “A Bela Adormecida”
acompanhado ao piano e interpretado sem brilho mas com dignidade por Tara
Bhavnani, de belíssimo físico e Don Hyun Seo.
O Royal Danish Ballet trouxe o pas de
deux de “Festival de Flores em Genzano” de Bournonville interpretado pela
deliciosa Diana Curri e Kristofer Sakurai, este último fora de peso
e com sérios problemas musicais; apesar de tudo pode-se apreciar
um fluído manejo de estilo. China trouxe quatro variações
“A Bela Adormecida” e “Paquita”, bem executadas por Lu Na; e “Dom Quixote”
e “Giselle” interpretados por Hoa Bo, o corpo mais eloqüente de todas
as delegações, um primeiro bailarino potencial que teve instantes
de refinada sensibilidade em sua “Giselle”.
O Instituto Superior de Artes do Teatro
Colon teve como erro fundamental a escolha do repertório para os
jovens bailarinos. Joaquín Crespo López não tem o
phisique du rôle para “La Sylphide” apesar de ter tido um desempenho
tecnicamente correto (o mesmo vale para o “Tamborilhero” de “Baile de Graduados”),
poderia render muitíssimo mais com outro repertório. Florentina
Chinelatto fez com simpatia a primeira variação de “Baile
de Graduados”, Andrea Pumar, o melhor elemento da delegação
e uma das bailarinas mais aplaudidas de todo o evento, foi competente nas
variações de “Satanella”, “Pas de quatre” (Grisi) e de “Aurora”;
em “Cisne negro” sua performance foi mais opaca. Já Andrea Perez
apesar de sua linda figura foi um verdadeiro desastre na “Fada lilás”,
sem terminações, com numerosos acidentes técnicos
e fora de música desde o primeiro passo. Definitivamente não
estava preparada para esta variação, Qualquer outra das fadas
do prólogo lhe houvera ficado melhor, já em “Paquita” mesmo
que também não tenha o phisique du rôle, sua execução
foi aceitável.
O problema de escolher repertório
para jovens é que os mestres preparadores se enganam com o rendimento
dos alunos nas aulas. Na sala a realidade é uma, no palco outra.
Uma observação disciplinar
se faz necessário, o jovem bailarino da delegação
argentina estava praticando suas piruetas na lateral do palco enquanto
outros colegas estavam dançando, chegando a aparecer a metade de
seu braço em cena. Isto é, sob todo ponto de vista, imperdoável.
A desilusão maior foi provocada
pela delegação russa, Elizabeta Belorivkina dançou
igualmente mal “Dom Quixote” e “Arlequinada” e Alexei Pryatkin se matou
a golpes em “O Quebra Nozes”, a grife Bolshoi está definitivamente
em baixa.
México
Os donos da casa tiveram grandes acertos,
para começar a Escola de Ballet de Monterrey mostrou um bom nível
acadêmico e uma eloqüente seriedade de trabalho. Na abertura
apresentaram “Cromáticas”, coreografia de gosto questionável
assinada por Carlos López onde se pôde apreciar a homogeneidade
de conjunto e a eficiência de alguns solistas, Com destaque para
Blanca Rios.
Alguns trabalhos menores como “Uma pedra
no caminho”, “Ao final”, “Mimos”, “Mãos vazias”, “Muito dentro da
Terra”, “Embaixo do temporal” e “Sonho de ares” embora em alguns casos,
por momentos, agradáveis, foram menos significativos. “La fille
mal gardée” teve limpa execução de Michelle Monreal
e Jacobo Ruiz; e o pas de deux de “Dom Quixote” por Katia Garza e Israel
Rodríguez não foi bem de duo mas sim de variações,
destacando a brilhante coda de Katia Garza. Mas foi em “La vivandiere”
onde o Jovem Ballet de Monterrey mostrou o que tem de melhor, técnica,
estilo e disciplina; com destaque para Katia Garza e Andrea Juárez,
jovem bailarina de salto prodigioso. A “Fada dos Bonecos” de Legat teve
simpaticíssima interpretação de Mónica Jáuregui,
Erasmo Pineda e Reveriano Camil.
A Escola Nacional de Dança Clássica
e Contemporânea do DF teve também notórios acertos,
a começar pela variação de “Paquita” pelo promissor
Javier Peña. O famoso “Huapango” de Gloria Contreras mesmo antigo
e com reposição questionável foi um dos melhores momentos
coreográficos do Congresso. Já não se pode dizer o
mesmo de “Sinfonia para nove homens” de James Kely que mesmo que conte
com empenhada execução resulta num pastiche coreográfico
“insalvável”.
Surpreendeu a Escola Municipal de Ballet
de Mazatlán (do noroeste do país) com meninas de sólida
formação e algumas delas (como Silvia Guevara) com um balance
fora do normal.
Entre as escolas particulares que complementaram
a programação se destacou Dance Center e Fomento Artístico
Cordobés, que revelou a jovem Anais Bueno, de importantes condições
físicas.
Os Profissionais
A participação de alguns
integrantes da Companhia Nacional de Dança do México, dirigida
por Cuautemoc Najera, abrilhantou as noites.
Carmen Correa e Rafael Santiago executaram
o pas de deux de “Cisne Negro” com bons momentos no duo e uma coreografia
naive de Carlos López: “La Silla”, mais apropriada para público
infantil. Carmen Correa interpretou também a variação
de “Carmen” de Alonso e a variação de solista do “Grand
pas” de “Dom Quixote” com visível solvência. Dentro
desta suite de “Dom Quixote”; que encerrou o evento, o pas de deux foi
confiado a Irma Morales e Jaime Vargas, de sólida técnica
acadêmica. No conjunto se destacou a argentina Agustina Galizzi,
recentemente integrada à companhia.
Reflexão necessária
A cada dia que passa o ballet reforça
mais e mais suas estruturas pedagógicas. Cada dia se sabe mais sobre
os corpos que o ballet forja e o modo em que este processo é levado
a cabo. Mais e melhores bailarinos são formados em todo o planeta
mas parece que isto só servirá para reforçar e revitalizar
as interpretações do repertório coreográfico
do século XIX, já que se há um fato indiscutível
é o vácuo criativo com o qual esta linguagem se depara. Não
há criadores na linguagem do ballet e isto é assustador.
O idioma do ballet é um código
fechado, um glossário limitado que talvez não permita expandir
horizontes a nível de linguagem; mas isto não implica em
pobreza artística. Pode-se criar no idioma do ballet mas com preocupações
estéticas contemporâneas, com plataforma ideológica
e filosófica para tal fim, com impulso genuíno de criação
e investigação.
Pois este Congresso constatou o que
sucede no âmbito mundial, tudo o que se viu criado com o instrumental
do ballet foi absolutamente prescindível e as vezes agressivamente
medíocre. Um montão de exercícios coreográficos
estéreis, de mau gosto, superficiais, sem razão de ser.
As dezenas de “obras-lixo” que vimos
em Monterrey são apenas uma mostra dos milhares de “obras-lixo”
que se exibem nos palcos de todo o planeta, melhor ou pior executadas não
negam sua essência, enfim lixo .
Conclusões
O Congresso Internacional de Ballet
Clássico e Contemporâneo arroja um grande saldo positivo,
em primeiro lugar por refletir a realidade do ballet no mundo dando uma
idéia global aos mestres e aos jovens bailarinos; e em segundo lugar
por deixar claro para todos que existem inúmeras engrenagens para
ajustar se desejamos uma evolução real e homogênea.
A pequena mas efetiva equipe que integrou
a comissão organizadora, liderada pelo lúcido e dinâmico
Coordenador Nacional de Dança do México, Horacio Lecona,
merece especial menção: Nina Serratos, Bernarda Gudiño,
Adrián García, Anastasio Ángeles, Aracelia de la Peña,
Laura Casas, Lourdes Lecona, David Arredondo, Priscila de la Vega e da
Escola Superior de Música e Dança de Monterrey, Angélica
Kleen e Cristina Lozano. Eles tiveram ao seu cargo a orientação
dos participantes pela complexa estrutura do evento, tarefa nada fácil
da qual se saíram airosos.
A função de um evento
desta natureza é de vitrine e de farol, expondo realidades e indicando
rumos possíveis; o qual foi plenamente logrado, e a estratégia
não é outra além de fazer circular altas doses de
informação nas veias de nossa dança.
Benvinda a iniciativa e oxalá
tenha continuidade.
Valerio Cesio