CONSIDERANDO O SALÃO



Yes, I’m one dancer


Na TV, nossa grande mãe de modismos e costumes, assistimos ao band kids, vemos o Schwarzenegger em uma propaganda engraçada (?) implodir o pobre diabo que não sabe a língua de Shakespeare ou ainda, somos aconselhados pela moça bonitinha a comprar aquele produto fashion, light ou good for you. Para os mais abastados a pedida é contratar o pay-per view e curtir o canal happy, premium, classic or emotion. Beautiful, isn’t it my darling?

Nas relações de trabalho não temos mais palestras, encontros ou dominamos algum saber. Vamos estar fazendo um workshop, estar propiciando uma happy hour e estar distribuindo know-how (repare neste gerúndio, outra praga assimilada por quem fala um inglês mais ou menos). Quando se tratar de informações financeiras, prepare-se para um “mix” de economês com inglês do qual você provavelmente não vai entender nada. Neste caso, desconfio que a intenção era essa mesmo.

Por tudo isso rola na cidade uma campanha contra a invasão do idioma inglês na vida do brasileiro. Mas é uma campanha agressiva, que incita ao boicote dos produtos e empresas que utilizam palavras ou textos em inglês. Pretende proteger o nosso, desrespeitando os demais.

Valorizar o nacional não é estragar, denegrir ou negar as qualidades do estrangeiro. Para ficar só na nossa área, temos que admitir que somos os criadores do samba, forró e lambada; mas o tango é dos argentinos e rock não é exatamente a nossa praia. Só essa diversidade faz com que cada povo tenha sua tradição e história. Somos sim uma grande aldeia global, mas com muitas tribos, graças a Deus.

Por obrigação, por inteligência e por amor temos que proteger e preservar nossa história, raízes e tradições. Dar vez à nossa indústria, conhecer nossa produção artística, prestigiar e sobretudo respeitar o que é nacional. Usar e abusar do nosso idioma que é belíssimo. Por que falar top, sale, off ou in concert? Para parecer importante, mais fino ou melhor? O que nos faz pensar assim? Por que o deles é melhor? Diferente sim, melhor não.

A pouco tempo tivemos um triste exemplo dessa atitude que demonstra o sentimento de menos valia que assola nossa gente. Com a desculpa que a palavra lambada estava "queimada", sem prestígio, resolveram renomeá-la - virou Zouk (festa em dialeto creole) - que é uma outra dança que já existia e se parece com o merengue. Pouco adiantou. Era para “dar prestígio” e na verdade descaracterizou uma manifestação cultural e ajudou a tornar mais difícil sua consolidação em nossa história artística.

Os argentinos choram Gardel, não importa que o chamem brega. Na Argentina a imagem de tangueiros é quase uma "logomarca" do país. A dança portenha é o tango, todo mundo sabe. Também não há quem não associe o fado aos portugueses e é corriqueiro vê-los cultuar o "vira". Dos russos temos gravada a dança "dos cossacos" conhecida internacionalmente, mesmo por aqueles que não sabem exatamente quem foram os cossacos.

Nosso forró, execrado em outras épocas posto que considerado uma dança marginal e menor, hoje é campeão nos bailes e não foi preciso chamá-lo de, por exemplo, “lindy hop”. Temos que nos curvar para o consagrado, o folclórico, o que está no sangue do nosso povo e que o mundo todo paga para ver, por que é bom, bonito e não tem igual.

O Brasil é samba e futebol. Nós inventamos o futebol de praia, somos seus campeões mundiais e fazemos o campeonato de beach soccer !!!! A continuar assim já podemos imaginar um novo samba enredo: Green and pink, is the Mangueira in my heart.... Definitivamente, um país é feito de suas cores, sua geografia, de sua gente. Um povo é feito de sua arte, música e sua língua.

Portanto resista: não agrida, não ridicularize, mas por favor, não permita que nos reduzam a um " I miss you" quando só em português conseguimos dizer “saudade”. Precisa mais?


Louis (opa!) Luís Florião é dançarino
e professor de dança de salão