A proposta da coluna “considerando
o salão” é abrir um novo espaço para reflexão
sobre diversas questões que envolvem a dança a dois, sua
história, sua evolução, suas perspectivas...
Porque considerando? No dicionário,
lê-se que o verbo considerar significa: pensar, ponderar, examinar,
observar, meditar em, apreciar. Numa outra abordagem podemos entender ainda
que trata-se de respeitar, levar em consideração, ter consideração
para com. O salão é o espaço onde se dança,
é o local da festa ou a sala de aula – é a casa do dançarino
e merece muitas considerações.
Pretendo então trazer pesquisas,
experiências, opiniões e vivências, aprofundar temas,
levantar e discutir as necessidades e possibilidades dessa arte. Na
estréia da coluna abordo o redescoberto e badalado forró.
De onde vem esse forró? Para onde vai?
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DOIS DEDOS DE PROSA
SOBRE O FORRÓ
Forró - A Música
Para definir as bases do forró temos
que falar um pouco do baião. A palavra baião que quer dizer
baiano, bailão ou bailar, designava, originalmente, uma introdução,
um "aquecimento" que dois ou mais cantores faziam para esperar a inspiração
e só então começar a cantar para valer, revezando-se
em repentes e músicas regionais para animar as festas e encontros.
O grande Luiz Gonzaga foi o responsável
por fazer do baião um gênero musical, ao desenvolver aquela
introdução, criando, gravando e difundindo o baião,
já como música inteira, não mais limitada ao som da
viola do cantador, mas com letra, arranjo e toda orquestração
sertaneja.
Foi também Luiz Gonzaga quem desenvolveu
o estilo musical que hoje conhecemos como forró quando deu molho,
balanço e tornou o ritmo do baião - que é mais quadrado
- mais picado e acelerado.
Forró - A Festa
Se você for convidado para ir a um forró,
vá! Todo mundo sabe que ir ao forró é ir a um local
onde acontece um baile com muita música e dança. Mas por
que forró?
"Foi o maior forrobodó" - significava
ter sido a maior bagunça, desordem, briga. Alguns historiadores
afirmam que a palavra forró seria a corruptela de forrobodó,
e assim teria origem pejorativa, como também acontece com "gafieira"
que designava um local onde se cometem gafes.
Outros estudiosos sustentam que a palavra
forrobodó, da qual teria se originado o nome forró, já
era conhecida e usada a vários séculos como designação
de baile ou festa com danças e cantorias. Pelos forrós do
Brasil dançou-se muita mazurca, polca, xote, xaxado e coco. Mais
modernamente o baião e o forró encontraram também
seu apogeu.
Geraldo Azevedo difundiu, na sua música
"For all para todos", que a denominação forró surgiu
quando da inauguração da primeira estrada de ferro brasileira
por ter a Great Western promovido uma festa com livre acesso a todos -
em inglês "for all" - e que o povo acabou mudando a pronúncia.
No filme brasileiro "For All" essa versão
foi contestada, já que o termo teria surgido no tempo da Segunda
Guerra Mundial, quando uma base militar americana instalada no Brasil promovia
as festas "for all". Há ainda importantes historiadores mais radicais,
que afirmam que isto é apenas uma história interessante,
porém pura fantasia. Dizem ainda que se esse fosse o caso as pessoas
tenderiam a falar foral, ou até foró, mas não forró
que tem pronúncia mais elaborada.
Forró - A Dança
O forró tradicional que é ainda
dançado no interior e em algumas escolas de dança de salão,
foi influenciado por diversos folguedos e danças populares, tais
como o xaxado, o xote, o frevo e o baião, sendo que, interessantemente
sua base principal (o pisa o milho) é muito semelhante ao carimbó.
O forró genuíno é sensual,
alegre e se caracteriza por movimentos muito marcados, fortes, bem definidos
e que lembram em alguns momentos danças indígenas.
Recentemente jovens passaram a dançar
ao som do forró "pé de serra" (que tradicionalmente é
tocado com zabumba, triângulo e sanfona) uma mistura de estilos que
muito tem a ver com a salsa e o "soltinho" que é chamada de forró
universitário. Por outro lado, com o surgimento do forróck
- forró executado (cabe aqui os dois sentidos da palavra) com aparelhagem
de som eletrônica e sintetizador, em cidades como Fortaleza e Recife
passou-se a dançar o que seria o "forró estilizado" e que
é muito mais próximo da lambada moderna.
Esses fenômenos têm sua importância
na medida em que atraíram os jovens para os salões e fizeram
ressurgir o forró, porém fogem completamente das bases desta
dança e o olhar do povo é comparativo, buscando sempre o
mais vistoso, o que tem mais brilho, o que muitas vezes pode levar a sérios
enganos.
Espera-se que a renovação,
o desenvolvimento e a evolução de qualquer manifestação
artística, respeite as bases e raízes desta arte. Só
assim mantém-se a tradição e a cultura de um povo.
A dança por ser uma arte de movimento exige especial atenção
na sua preservação.
O problema não está na continuação
e nas mudanças, mas na ruptura, no aprendizado errado das características
de cada modalidade. Isso sim pode e costuma causar distorções
maléficas.
Luís Florião
é dançarino
e professor
Interessantes fontes de pesquisa
que devem ser consultadas por aqueles que queiram saber mais, sendo que
também serviram para a elaboração deste trabalho:
Dicionário do Folclore Brasileiro de Câmara Cascudo, os trabalhos
dos pesquisadores Eleuda de Carvalho e Alberto Ikeda, e também o
Novo Dicionário da Língua Portuguesa de Aurélio