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Jornal DAA Mosaico - 66

MOSAICO


A colunista Marina Martins faz do Mosaico um espaço ainda mais aberto às variadas facetas da modernidade. Ampliamos a multiplicidade de visões e pensamentos graças à colaboração de profissionais convidados por ela a compartilhar com seus textos desse nosso quebra-cabeças contemporâneo. Neste número colabora Lígia Tourinho falando sobre interessante tema: O Discurso da Diversidade na Dança Contemporânea

Manifesto sobre o discurso da Diversidade: Todos somos seres dançantes, porém apenas alguns possuem a dança como ofício.

 

                Desde que o homem sabe de sua existência enquanto homem, é um ser dançante - dança para as colheitas, para os deuses, para a fertilidade, para a chuva. Dança para a corte, para se divertir, para comunicar algo ao mundo. Dança simplesmente pelo prazer na motricidade, pela necessidade de estar em movimento e de expressar coisas que não cabem em palavras.

                A dança enquanto manifestação sempre esteve e está presente no cotidiano dos homens. As festas urbanas contemporâneas são famosas pela bebida, pela música e pela dança, que é a grande responsável pelas relações nelas estabelecidas. Dança-se para descontrair com os amigos, para relaxar, para paquerar. A dança está na sociedade enquanto arte e enquanto atividade intrínseca ao ser humano.

                Esta dança enquanto atividade é diferente da dança enquanto arte. Os seres dançantes são artistas e não artistas, porém, apenas os artistas possuem a dança enquanto ofício. Todos podemos ser dançarinos de profissão em potencial, porém de fato só alguns o são.

                Atualmente fala-se muito na diversidade de corpos na dança, de que todos podem dançar. Porém precisamos atentar para não classificar todas as manifestações de dança como manifestações artísticas. Neste contexto nos cabe refletir sobre o que vem a ser a arte e o que vem a ser o labor do artista. Não podemos confundir o discurso libertador da diversidade na dança artística, que amplia o campo do bailarino para a utilização de qualquer código e signo e o liberta dos códigos determinados por escolas de dança específicas, com a idéia de que qualquer corpo em estado de dança esteja se manifestando artisticamente. O ofício do dançarino requer uma intensa prática e investigação de movimentos, um profundo conhecimento sobre as conexões corporais, sobre a anatomia, a fisiologia, a motricidade. Um conhecimento que não é só dos livros, mas das salas de ensaio e da vivência de diversas emoções e informações sobre o mundo, contidas na possibilidade de qualquer gesto.

                A idéia de técnica consiste no mecanismo de execução de um determinado movimento. Técnicas, todos temos, para milhares de atividades que executamos ao longo de nossas vidas. A técnica da dança contemporânea não está fundada em repetir apenas padrões fixos de movimento. Pode ser ampla, livre, porém sempre investigativa. Incorporar a diversidade exige uma disciplina ainda maior do que a de repetir padrões fixos, exige a disciplina de se manter na proposta original de investigar o novo, o movimento essencial de cada um. Requer uma intensa pesquisa fundada na seriedade.

Existe uma tendência contemporânea em utilizar o discurso da diversidade para justificar a falta de trabalho. A diversidade implica em aceitar todas as escolas de dança e pesquisas de movimento, em aceitar que não existe um padrão corpóreo único para os dançarinos. Por mais que se distancie de qualquer padrão ou escola, a intimidade com a sala de ensaio, a investigação e doação para o movimento ainda são requisitos básicos para o ofício da dança. A diversidade não dispensa o devir, no sentido mais "artaudiano” da palavra. Falar em diversidade e em dança contemporânea hoje requer uma imensa responsabilidade, a de perpetuar e dizer coisas ao mundo no espaço sagrado da cena. A cena contemporânea não é um ringue de vale tudo onde basta estar. Não basta estar em cena, é preciso dizer algo nela.

 

Lígia Tourinho é

Doutoranda em Artes pelo Instituto de Artes da UNICAMP

Professora substituta do Departamento de Arte Corporal da UFRJ


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